Um novo catalisador à base de níquel, zinco e carbono transformou dióxido de carbono em monóxido de carbono, um importante intermediário para gerar produtos de valor agregado. Pesquisa foi destaque em duas publicações estrangeiras
Um novo catalisador, composto à base de níquel zinco e carbono, foi capaz de transformar CO2 (gás carbônico), um dos principais gases de efeito estufa (GEE), em CO (monóxido de carbono), mesmo em ambiente de alta pressão. O CO é um intermediário capaz de gerar outros valiosos produtos. “O resultado da nossa pesquisa mostra que estamos cada vez mais próximos de produzir, por meio da catálise, derivados de petróleo, como plásticos e combustíveis”, comemora Liane Rossi, professora do Instituto de Química (IQ) da USP e coordenadora do estudo realizado no âmbito do Fapesp Shell Research Centre for Gas Innovation (RCGI).
Tal pesquisa teve grande destaque em publicações estrangeiras, como na revista científica European Journal of Inorganic Chemistry (Eur JIC). O site o site ChemistryViews também divulgou o estudo.
Esta pesquisa foi conseguinte a um estudo anterior, coordenado também pela professora Liane Rossi. Neste estudo, descobriu-se que um catalisador composto por níquel obteve maior desempenho quando submetido a altas temperaturas (800 graus Celsius) e em atmosfera de CO2 e H2 (hidrogênio), ou de metano e propano. “Esse processo possibilitava um excelente catalisador para a redução de CO2: ele gerava exclusivamente CO, sem sinal do produto menos desejável, que é o metano (CH4)”, aponta Liane. O resultado foi publicado no Journal of the American Chemical Society, em março do ano passado.
Contudo, o catalisador não foi capaz de ter seu pleno funcionamento em alta pressão (entre 20 e 100 bar), fator importante para que o CO pudesse ser transformado posteriormente em produtos líquidos. “Quando forçamos as condições para maiores pressões percebemos que além de CO era também produzido muito metano”, comenta Liane. “E isso é um problema porque queríamos obter apenas o CO: por ser mais reativo, ele é capaz de formar líquidos de longas cadeias de carbono e hidrogênio e, desta forma, gerar produtos de valor agregado. O metano, ao contrário, não tem a mesma facilidade de se transformar em produtos líquidos.”
Uma solução a este problema foi desenvolvida pela doutoranda do IQ Nágila Maluf, membro da equipe de pesquisadores da professora Liane. “Essa combinação muda a forma como as moléculas interagem na superfície do catalisador, se comparado ao níquel puro”, observa. Os experimentos aconteceram em dois grupos de pesquisa do IQ: o Laboratório de Nanomateriais e Catálise, coordenado por Liane, e o Laboratório de Carbono Sustentável, coordenado pelo professor Pedro Vidinha, coautor do trabalho. Da fase de testes também participaram o Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP e o Pacific Northwest National Laboratory (PNNL), dos Estados Unidos.
A pesquisadora afirma que estes catalisadores são amplamente empregados na indústria, assim como utilizados cotidianamente em processos como a purificação em exaustão de automóveis. “Os catalisadores são substâncias que promovem reações químicas entre duas ou mais moléculas. Eles podem ser, por exemplo, enzimas ou superfícies metálicas, como é o caso desse estudo. Os catalisadores em geral têm a função de acelerar a reação entre moléculas que não iriam reagir naturalmente, ou que reagiriam apenas muito lentamente”, explica.
Mais além, os catalisadores também possuem papel fundamental para o direcionamento de reações químicas para a formação daquilo que procura-se. “As moléculas, ao serem submetidas ao catalisador em determinada temperatura, se ligam a ele e sofrem um processo que envolve a quebra e a formação de novas ligações químicas, possibilitando que novos compostos sejam formados e assim abandonem o catalisador”, relata Liane. “As reações entre gases também podem ser beneficiadas pelo aumento da pressão, como no experimento que estamos fazendo. Isso porque os processos já conhecidos para transformar CO em líquidos, como álcoois, hidrocarbonetos ou olefinas, ocorrem em reatores pressurizados.”
Conforme a explicação da professora Liane, o êxito obtido na transformação de CO2 em CO em alta pressão é de suma importância para que haja integração com as etapas seguintes, as quais irão utilizar o produto intermediário, CO, para outros catalisadores e, por fim, gerar outros compostos líquidos. “Quanto mais semelhantes as condições de operação das duas etapas, melhor para o processo, pois podemos avaliar o uso de dois catalisadores em um mesmo reator. De qualquer forma, para que esse processo seja viável do ponto de vista comercial precisamos utilizar a alta pressão”, aponta Liane.
Neste momento, a equipe de pesquisadores prepara-se prosseguir com o estudo. “O próximo passo é utilizar no mesmo reator dois catalisadores diferentes. Um deles é esse à base de níquel, zinco e carbono; o outro, à base de ferro ou cobre”, conta a professora. Liane aponta que este segundo catalisador deve ser favorável à reação entre moléculas de CO e H2 para produzir álcoois ou hidrocarbonetos, produtos de valor agregado. “Isso vai ser possível por meio da síntese Fischer-Tropsch, processo descoberto na década de 1920 capaz de produzir combustíveis sintéticos, mas que nunca decolou para uso industrial, devido à concorrência com os produtos mais baratos obtidos diretamente do petróleo. Agora, com o aquecimento global e um interesse mundial em processos de mitigação das emissões de CO2, a história pode ser diferente.”
Fonte: Jornal da USP | Cientistas da USP estão cada vez mais perto de transformar gás carbônico em combustíveis ou plásticos via catálise